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Taylor Swift - The Tortured Poets Department

THE TORTURED POETS DEPARTMENT: THE ANTHOLOGY

2024 •

REPUBLIC

Pretensioso e sobrecarregado, o novo álbum de término de Taylor Swift é um mosaico das melhores e piores qualidades da cantora. Essa é a prova do porquê ela é uma das melhores compositoras, mas também uma das estrelas pop mais ridicularizadas.
22/04/2024

Existem dois momentos na carreira de Taylor Swift que serviram como ponto de ignição para construção desse novo disco. Em 2014, na época do lançamento do seu primeiro álbum totalmente pop, 1989, Swift disse em uma entrevista que nunca havia se sentido “ousada, legal ou sexy”. Durante toda sua carreira, ela foi posta em holofotes que constantemente demandaram dela uma pose engessada, essa qual ela seguiu até mesmo nos seus instantes mais divergentes — seu disco pós-morte Reputation, de 2017, apareceu com cobras, mas tudo dito parecia ser pensado duas vezes antes de ser falado. No entanto, com seu diário de isolamento Folklore, a compositora pareceu um pouco mais solta, principalmente em “Mad Woman”, na qual ela assumiu sua raiva como um protesto feminista, sem tantas amarras. Este foi um processo de quebra com sua crença calculada em prol de essência, na qual declamar sua raiva parecia mais importante do que seus caminhos para isso. Nesse seu novo álbum, no entanto, Taylor aparece em sua forma mais legal, crua e sem filtros — tanto para o bem, quanto para o mal. 

The Tortured Poets Department: The Anthology é um trabalho de mais de trinta canções, que se estende para mais de duas horas de duração — esse é o segundo registro mais longo de Swift, ficando atrás apenas da regravação de Red, de 2021. Debruçando-se em cima de temas familiares para seu material recente — morte, perda, traição, angústia, desolamento, vícios, depressão e tentativa de seguir em frente —, o disco examina os dois últimos anos da carreira da cantora, focando principalmente no seu término com Joe Alwyn, seguido pela sua breve saidinha com Matt Healy e seus esforços para seguir em frente enquanto comanda o trono de maior estrela pop do momento. Voltando para estruturas de composições longas e mais detalhadas, com forte apoio de metáforas e palavreado rebuscado, Tortured Poets é sua obra mais completa e honesta, mas também seu projeto mais pretensioso e maçante. 

Uma das luzes mais inusitadas pela qual essa recém-ousadia bem estruturada é sentida é a caneta de Swift, que discorre mais bravamente do que nunca. Esse arrojo surge no meio das entrelinhas de assuntos que finalmente tem espaço para respirar, mas também na estrutura que essas canções assumem. Em “But Daddy I Love Him”, Taylor empresta uma linha do filme A pequena sereia (1989) para mandar uma mensagem para aqueles seguidores que se dizem preocupados com ela, mas parecem apenas nervosos sobre como a imagem dela pode afetar o fanatismo deles dentro de suas bolhas sociais: “I’ll tell you something ’bout my good name / It’s mine alone to disgrace / I don’t cater to all these vipers dressed in empath’s clothing”, ela canta durante um sintetizador cíclico em ritma de cavalaria. Um pouco mais tarde, ela se permite ser imperfeita: em “I Hate It Here”, ela assume falar coisas erradas e se permite reconhecer seus erros, quando feitos em instantes de desespero (“I’d say the 1830s but without all the racists / […] Everyone would look down ’cause it wasn’t fun now / Seems like it was never even fun back then / Nostalgia is a mind’s trick”), e em “​​thanK you aIMee”, ela finalmente endereça seus problemas com Kim Kardashian, escrevendo sua canção de vingança mais efetiva e útil: “And one day, your kid comes home singin’ / A song that only us two is gonna know is about you”. 

Paralelamente, existe uma dose bem distribuída de canções que remontam a fama de Swift e sua maior característica: escrever canções de término que sempre ponderam sobre o que realmente aconteceu, do que, propriamente, poderia ter ocorrido. Em “So Long, London”, os vocais angelicais se rasgam em uma batida cíclica e nervosa de Aaron Dessner e estabelece um efeito de sufocamento, esse mesmo que Swift sentiu durante os últimos meses em relacionamento com Joe Alwyn. “You swore that you loved me, but where were the clues? / I died on the altar waitin’ for the proof”, ela canta. Depois, em “LOML”, ela brinca com o significado duplo da sigla enquanto tece um diário de ruptura — sua dor é tanta que é automaticamente ligada com “Last Kiss”, de 2010: “You and I go from one kiss to getting married / Still alivе, killing time at the cemеtery”. No mesmo passo, “The Black Dog” cria uma conexão metafórica entre um bar e a melancolia, enquanto em “How Did It End?”, ela se põe angustiada com a preocupação maior sobre um término ser sempre a performance social popularesca disso, ao invés de uma análise de caráter. Entretanto, embora se alinhem ao trabalho passado de Taylor, elas estão longe de carecerem da transparência recém-alcançada. 

Tortured, com essa sua valentia e lisura, é um grande mosaico das melhores e piores qualidades da cantora. Em outras palavras, ela apresenta todos os motivos pelos quais Swift é odiada e considerada uma das compositoras mais relevantes da música popular. Esse novo ensaio, novamente, é produzido por Jack Antonoff — com quem Taylor tem trabalhado incansavelmente desde 2014 — e Dessner, um colega que a cantora encontrou conforto durante suas aventuras no meio alternativo durante o isolamento social. Os tons que Antonoff tem usado são, de fato, esgotantes, mas nem sempre parecem uma reciclagem exagerada: “The Tortured Poets Department” empresta uma bateria sprinsteeniana, direto do clássico Tunnel of Love, de 1987, enquanto “Fresh Out The Slammer” e “Who’s Afraid of Little Old Me?” optam por cordas empoeiras que ressoam as trilhas sonoras de filmes de faroeste. “Florida!!!”, com Florence + The Machine, rapidamente se elencou como uma das melhores colaborações das artistas, graças aos berros exorbitantes de uma bateria no refrão. Na verdade, por mais que toda batida base seja (muito) idêntica, os adornos que envolvem ela acabam trazendo um frescor — diferente do que aconteceu em Solar Power, de Lorde, e Chemtrails Over the Country Club, de Lana Del Rey.

Se Jack foi o favorito do público de Swift durante suas aventuras oitentistas, depois da fuga para floresta com Dessner em Evermore (2020), o protegido passou a ser o membro da banda The National. Enquanto Antonoff produziu grande parte do primeiro lado do disco, Aaron trabalhou em quase todas as canções da segunda metade. Isso fica muito claro quando você nota que as primeiras canções são carregadas de reverb e leves distorções, ao passo que as últimas beiram uma sessão acústica. “The Albatross”, na qual a compositora usa o imaginário da ave como um guerreiro de ataque, as cordas são esparsas e solitárias; enquanto “So High School”, uma carta de amor para Travis Kelce, rememora o pop rock dos anos 2000, mas o tratamento sonhador dilui sua existência ao puro saudosismo. Porém, a visão de Aaron nem sempre é concreta, ao passo que grande parte dos fillers estão presentes na sua parte: “I Look in People’s Windows”, The Prophecy” e “Cassandra”. Todas essas têm seus pontos fortes, mas num disco duplo, sua existência é dilacerada e mal lembrada. 

Essa complexa e densa miscelânea de canções patina casualmente no que Swift sempre soube fazer de melhor. Claro, ela é uma das maiores compositoras do pop, mas suas líricas nem sempre ressoam como ela imagina. Na faixa título, as referências para Patti Smith são bem-vindas, mas os longos versos batalham para entrar na estrutura mais rápida do som — e não, a linha sobre o Charlie Puth não é incômoda. “I Can Do It With A Broken Heart”, assim como “Anti-Hero” e “My Boy Only Breaks His Favorite Toys”, é um sad-pop bem executado, mas tem um deboche que parece calculadamente pensado para ser tornar uma trend do TikTok. Tudo isso para dizer que, no entanto, Tortured também tem seus instantes que sua confiança é tão alta que beira a petulância e torna-se casualmente pretensioso. Pela primeira vez, Taylor está 100% confiante de que suas músicas são boas — justamente quando nem todas são. 

“Clara Bow” e “The Manuscript” são as duas canções de encerramento. Essa primeira, que fecha o lado A, empresta o nome de uma atriz norte-americana do começo do cinema que ficou conhecida como a primeira It Girl da história. Nela, Swift olha com carinho para sua sucessora e para si mesmo: “You look like Taylor Swift / In this light, we’re lovin’ it / You’ve got edge, she never did / The future’s bright, dazzling”, ela canta, enquanto não é difícil imaginar essa ternura sendo posta em cima de Sabrina Carpenter ou Olivia Rodrigo. No caso da segunda canção, seguir em frente é dosado com olhar para o passado da visão de um aprendiz: “Now and then I reread the manuscript / But the story isn’t mine anymore”. Para um disco repleto de vislumbres de drogas, morte, raiva, traição, angústia e desespero, Swift parece sair dele com esperança sobre seu destino — e mais do que nunca, isso está apenas nas mãos dela. 

 

EPÍLOGO

De agora em diante, eu falo diretamente com meu leitor, assumindo minha posição como escritor, para lhe dizer que esse texto, em específico, é minha escrita mais diferente até hoje. Se você atualizar essa página e olhar atentamente para a nota dada para esse disco, perceberá que ela muda todas as vezes que você entrar novamente nessa crítica. Faço isso dois motivos: em primeiro, honestamente, vocês nunca ligaram para metade das palavras que eu escrevia e sim para os números que roubam a cena e que estão postos no holofote da página. Em segundo, depois de três anos escrevendo sobre música, chego a uma conclusão, essa que vem com a maturidade e que eu gostaria de deixar para você, ao passo que assino meu último texto para esse site: músicas, pessoas, perspectivas e o tempo mudam toda hora, e cada pessoa tem sua própria visão das coisas. É totalmente justo tentar capturar uma opinião por meio de uma escala de zero até dez, mas quando isso passa ser mais importante que qualquer canção, qualquer disco e qualquer discussão em cima dessa arte, talvez as coisas estejam tomando um rumo cada vez mais torto e incerto. Encerro com isso: nunca deixe que tudo isso que vocês amam tanto ser sobre números e reputação. Por muito tempo, eu deixei e deixei que aplicassem isso em cima do meu trabalho — e me arrependo amargamente disso. Sigo em frente mais leve do que nunca, em busca de minutagens mais saudáveis. O futuro nunca pareceu tão brilhante. Espero que para vocês também.

— Para sempre com amor, Léo!

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