Em seu primeiro álbum, Paint My Bedroom Black, Holly Humberstone tenta compactar a sua própria pessoa dentro do disco, divergindo entre o seu lado mais introvertido para o mais extrovertido. Assim, comprimindo toda a intensidade de suas emoções na narrativa de uma obra de duração mais longínqua que as criadas por ela anteriormente. Mais que apenas isso, este projeto é um tremendo desafio para a jovem, pois desafia o seu conhecimento e pouca experiência no âmbito musical a entregar um trabalho que fosse condizente com o seu grande talento, e que despertasse o interesse do público em acompanhá-la daqui em diante. Será que a garota do intimista Falling Asleep At The Wheel, de 2020, consegue trazer o que nos é esperado? Um disco conciso e coerente, cujo conteúdo consegue ser interessante e intuitivo e, ao mesmo tempo, consiga destrinchar as temáticas trazidas pela cantora de forma organizada? Ou, por acaso, encontramo-nos à frente de mais um produto desleixado e pouco inovativo lançado no mundo? Eis a resposta para tais indagações dentro do universo quadrilátero criado por Humberstone.
Ao entrarmos no quarto de Holly, a primeira coisa na qual reparamos é que estamos a ocupar um espaço muito grande. As dimensões dos planos se estendem para longe, e faz com que as ideias desenvolvidas pela cantora neste lugar se acomodem numa área propensa para o seu desenvolvimento. Não são ideias espetaculares, visto que soam como resgates de momentos vividos por outras figuras mais emblemáticas da cena musical na qual ela reside, como, por exemplo, a banda The 1975 ou a Samia. No entanto, conseguem se tornar interessantes na medida que o tempo passa. Em “Ghost Me”, temos a incidência de uma batida cativante de indie rock e indie pop, que primeiramente pouco interessa o ouvinte pela sua obviedade e falta de originalidade. Entretanto, vai conquistando-o quanto mais é escutado graças ao seu refrão iluminante, no qual Humberstone canta sobre a sua preocupação em ser deixada de lado pelo seu pretendente: “I can barely make you out in the artificial light / And if you try to ghost me / And quit being in my life / Don’t you dare / Don’t you dare”. A composição desta faixa revela Holly como uma exímia compositora, ao conseguir expressar as suas emoções conflitantes de forma acessível e identificável, sem deixar o material simplório ou preguiçoso. Aliás, o primeiro verso é um dos melhores escritos que eu já li neste ano: “I’ve been crying all night / And I know I shouldn’t google the symptoms / But it hurts this time / Kinda thought that I could handle the distance”. O mesmo exemplifica com exatidão e uma apuração palpável a realidade dos jovens da era moderna.
A faixa-título, “Paint My Bedroom Black”, primeira canção do disco, abre a passagem para o mundo imaginário da jovem e também possui uma produção de indie pop e indie rock — cuja sonoridade remete bastante a uma versão mais orgânica e menos ousada de “Love It If We Made It” da banda britânica The 1975. Contudo, para os moldes do gênero de Humberstone, a música se definiria apenas como mais um acréscimo ao montante, levando em consideração que ela não se dá ao trabalho de soar diferente de nenhuma das demais lançadas na cena atualmente. Então, acaba sendo esquecível e pouco excitante, contudo, não se torna também medíocre por conta da performance vocal bastante segura da jovem e sua composição inspiradora sobre ser quem você é e aproveitar a vida. Já “Into Your Room”, soa mais entusiasmante e memorável, ao replicar melhor a estrutura das canções típicas do synthpop e alt-pop. Novamente, Humberstone pende para a obviedade, utilizando artifícios musicais muito conhecidos, entretanto, a qualidade técnica da faixa consegue sobrepor tal falha e a destacar como um bom momento de Paint My Bedroom Black.
Há várias outras canções no disco que soam tão desinteressantes, às vezes até mais, quanto “Paint My Bedroom Black”, entretanto, temos ótimas canções distribuídas ao longo do percurso. Porém, infelizmente, a qualidade delas não é alta o bastante para tornar o projeto verdadeiramente bom. Além de tal inconstância qualitativa presente na tracklist, Paint My Bedroom Black carece de ousadia e originalidade. “Coccon” tem uma produção tão simples e inofensiva de indie pop que chega a ser ofensivo ao grande talento que Holly possui enquanto produtora.”Kissing In Swimming Pools” é uma balada tão entediante que consegue dar uma boa noite de sono até para o mais perturbado dos pacientes de um hospício. Holly conseguiu desenvolver de maneira devida todas as ideias que vieram a sua cabeça, mas isso não quer dizer que sejam boas, são extremamente óbvias, e isso dificulta muito a estabilização de uma proximidade maior do ouvinte com o trabalho. Por exemplo, o segmento sonoro mais sóbrio e polido de “Baby Blue”, que se trata basicamente de apenas Humberstone cantando brevemente com efeitos vocais incisivos, é até interessante, no entanto, outros contemporâneos tomaram essa mesma direção no passado e tiveram resultados melhores, como a cantora Samia em seu single, “Pink Balloon”.
Paint My Bedroom Black não necessariamente é um trabalho desleixado, mas é miserável. Sofre bastante pela falta do seguimento de um direcionamento artístico melhor estabelecido. Holly se sustentou demais nas próprias influências e se acomodou em sua zona de conforto. Caso queira agravar uma marca maior e permanente na indústria e se tornar a estrela que está destinada a ser, a jovem deve voar para fora de seu ninho e se aventurar pela tortuosa, traiçoeira e profunda floresta que é o mundo, para então erguer-se e alcançar a sua glória. Ela deve experimentar, errar, aprender, para então suceder com a sua carreira, porque pelo contrário, ela só será lembrada como um clone fajuto da Phoebe Bridgers ou da Billie Eilish. E seu álbum de estreia? Apenas como uma réplica menos inspirada do The Baby da Samia, ou algo do tipo — o que seria algo muito triste.